6.2.10

Lilith


Lilith era a senhora do palácio. Fama de encantadora de homens, mulher insaciável, com vontades, desejadas por todos aqueles que a viam passar, em caminhares altivos e colo semi-descoberto. Deixava sempre rastos de desejo no reino chamado de Nod. Lilith vivia rodeada de servas que a conheciam ao pormenor. Diria mesmo em todos os pormenores. Naqueles tempos, naqueles onde os anos não se contavam, aquelas mulheres passeavam-se nuas umas pelas outras, por entre incensos, frutas frescas e perfumes secretos de tamarindos acabados de colher. Lilith era bajulada, tocada, beijada pelas escravas em noites de luar dourado reflectido em adornos de pulsos e tornozelos, de corpos vestidos em transparências. O vinho corria-lhes sempre em gargantas sedentas de sexo. Bebiam-no em partilhas de bocas e beijos prolongados. Perdiam-se em descobertas de corpos morenos, onde os dedos e línguas serviam de garimpeiros à descoberta de tesouros escondidos em lugares recônditos dos corpos de fogo-fátuo. Eram elas também que cuidavam e preparavam todos os homens escolhidos por Lilith. Provavam-nos, gozavam dos seus corpos, banhavam-se no sémen libertado em jogos colectivos a várias mãos, durante o banho purificador tomado antes da passagem ao aposento principal.
Naquela manhã, no seu passeio matinal, Lilith visitou mais uma vez os pisadores de barro. Homens de músculos fortes, trabalhados por tarefas duras, longas e exigentes. Ali, o cheiro do barro misturado com a palha, destacava o odor dos suores corridos. Para a senhora do palácio, aqueles cheiros excitavam-na e constituíam factor de escolha. Mais uma vez isso aconteceu. O homem chegado na noite anterior era o alvo. Bom trabalhador, pouco falador e de sinal na testa, que ele fazia tentar passar como sendo de nascença. A túnica esfarrapada e suja, barrenta, colava-se no corpo suado, e o cheiro, como dardo, alvejava poros abertos da pele da senhora sedenta e insaciável. Escolha feita, ele, o pisador viajante dos tempos futuros e passados que ninguém conhecia.
Chamado ao palácio, logo foi recebido pelas escravas, conhecedoras das suas funções e direitos. As provadoras oficiais do reino. Conduzido por elas a um quarto separado, … foi despido e logo lavado dos pés a cabeça com água tépida. O contacto insistente e minucioso das mãos das mulheres provocou-lhe uma erecção que não pôde reprimir… elas riram e, em resposta redobraram de atenções para com o órgão erecto, a que, entre novas risadas, chamavam flauta muda, o qual havia saltado nas suas mãos com a elasticidade de uma cobra. O resultado, vistas as circunstancias, era mais do que previsível, o homem ejaculou de repente, em jorros sucessivos que, ajoelhadas como estavam, as escravas receberam na cara e na boca”. (in Caim de José Saramago)
Esta recepção deixou-o amedrontado e receoso das luxúrias vindouras. Quando entrou, encontrou Lilith nua, deitada em cetins que lhe realçavam o sorriso de serpente do paraíso. Ele sabia para o que ia. Na cidade, todos falavam dos apetites grandiosos da senhora, do seu corpo belo de princesa encantada, chamada de bruxa pelas invejas das mulheres que ouviam os murmúrios dos maridos adormecidos, sussurrando o nome da senhora, noites a fio. Com um sorriso, Lilith ordenou o início das actividades. Deixou um seio a descoberto, e as pernas entreabertas numa provocação experimentada. Ele no auge da sua inexperiência, deixou-se guiar pelo instinto acordado dentro de si e tratou daquele corpo tão bem cuidado com a experiência adquirida pelos músculos durante os trabalhos duros e violentos a que estava habituado. Uma violência doce fazia Lilith estremecer. Gemia rolava em cetins que ferviam agora com toda a intensidade das penetrações fortes, fundas, longas. As unhas cravavam-se em músculos suados, com restos de cheiros de barros pisados por marchas cadenciadas, que agora Lilith sentia dentro dela. Mordia-o ferozmente, como fera enraivecida. Marcava-lhe o corpo com linhas vermelhas e sulcos de dentes afiados. Os gritos de prazer e dor misturavam-se, transpiravam, ecoavam em todas as paredes do palácio, e procuravam as risadas invejosas das escravas que, como a sua senhora, não contiveram os sinais húmidos que em escorridos as enchiam de brilho nos olhos.

5 comentários:

  1. Lilith era quente e intensa.

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  2. Anónimo6.2.10

    "flauta muda..."

    Linda metáfora.
    Sentindo-Te, fazes sentir as vibrações do corpo, os estímulos escondidos.
    Delicioso!

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  3. lilith ou a caverna de ali baba...!?


    talento e rigor numa escrita que me transporta para além dos meus melhores sonhos


    beijo.TE

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  4. Outra escrita que eu gostaria que fosse minha :-D

    (Mas antecipas-te sempre:-D))
    Beijos de Luar

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  5. Me apaixonei pela foto!!!

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